sábado, 2 de julho de 2011

Quim. "Nos sub-15 fiz uma assistência para golo do Nuno Gomes"

E ainda hoje os dois amigos que se cruzaram no Benfica falam do mesmo lance. Agora em Braga





Quim já falhou um Campeonato do Mundo (2002), porque foi apanhado com doping (Nandrolona) - esteve suspenso seis meses mas depois deram-lhe razão. Quim já falhou um Campeonato Europeu (2008), porque no último remate de um treino se lesionou num pulso. Quim já falhou uma época inteira (a última no Braga), porque num simples salto rompeu o tendão de Aquiles. Quim já perdeu o lugar numa equipa (Benfica), apenas por capricho e equívoco do treinador Ronald Koeman (lançou Moretto). Quim até acabou fora da Luz, por decreto de outro técnico (Jorge Jesus) que o dispensou em directo numa entrevista à RTP. Mas como recuperou sempre, Quim, o bicampeão e melhor guardião do Benfica depois de Enke (Moreira, Bossio, Moretto, Butt, Roberto, etc.) está aí para as curvas. Aos 35 anos, no Braga, ainda nem sequer pensa quando vai acabar a carreira.

Quantas vidas tem o Quim?

Ah, não é uma questão de quantas vidas são. São só momentos bons e maus que vão acontecendo... nuns ou noutros temos de seguir em frente. Passei por muita coisa, mas acredito no meu trabalho.

Não é muito de se queixar disto ou daquilo pois não?

Não gosto muito de aparecer, de procurar protagonismo. Muitas vezes me disseram que acabei prejudicado porque neste ou naquele momento preferi falar calado, mas eu cá vou na minha vidinha, a ser sempre o mesmo. E assim vai continuar a ser. Sei é que tenho uns amigos, uma família, uma mulher e uns filhos fantásticos que nunca me falham.

Quantos filhos tem?

Dois.

Algum guarda-redes?

O mais velho tem dez anos, mas acho que está mais inclinado para marcar golos.

Os miúdos querem é ser Ronaldos.

Querem ser avançados, mas já vão aparecendo muitos miúdos para a baliza.

Jogou sempre na baliza?

Não, era avançado, tive essa fase, e aos 13 anos ainda jogava lá na frente. Um dia faltou o guarda-redes, não havia mais ninguém e lá fui eu para a baliza. Nunca mais de lá saí, ou seja, sou guarda-redes por acaso [gargalhada].

Que grande acaso. Levou-o ao Braga, ao Benfica, a ser campeão, a ser internacional português!

Pois, mas não foi fácil.

E foi fácil regressar a Braga, romper o tendão de Aquiles e ver de fora a final da Liga Europa?

Nada! Quando regressei ao Braga o clube tinha acabado de fazer o segundo lugar no campeonato, estava com a expectativa de me integrar e fazer uma grande temporada. Aquilo que aconteceu depois, chegar à final da Liga Europa, se me contassem ao início eu não acreditaria... mas pronto, fiquei a torcer de fora e fiquei feliz pelos meus colegas.

Esteve no Braga dos anos 90 e voltou lá agora. Como é possível um clube desta dimensão chegar a este nível? Qual foi a grande diferença?

Foi a chegada do presidente António Salvador. Ainda o apanhei antes de sair para o Benfica, as opções dele foram sempre fantásticas, a todos níveis, por exemplo, a contratar jogadores e treinadores.

Agora contratou o Nuno Gomes.

E vocês vão reencontrar-se quase 20 anos depois.

[Quim responde ainda sem dar o negócio como certo; a entrevista foi feita na quarta-feira] Se essa notícia se confirmar será óptimo, é um grande jogador. Jogámos nas selecções desde os 15 anos, sempre foi grande colega, boa pessoa. Faz a diferença dentro e fora do campo.

É também por fazer a diferença fora do campo que a saída do Benfica é ainda mais estranha?

Sim, porque conhecia o balneário e sabia o que era a mística. Integrava toda a gente, além disso, praticamente viveu sempre para o Benfica. São opções... Mas fora do campo foi útil, na época passada não jogou nem uma hora e marcou cinco golos! Fiquei surpreendido.

Era o seu melhor amigo na fase Benfica?

Sim, por tudo o que passámos ao longo dos anos. Lembro-me de um episódio engraçado: no primeiro jogo em que nos encontrámos na selecção sub-15 fiz uma assistência para golo do Nuno Gomes.

Como!

Vi-o lá na frente, isolei-o com um pontapé. Ainda hoje recordamos isso quando nos juntamos.

O Nuno Gomes foi seu adversário também. Houve algum avançado que não o deixasse dormir bem?

Há muitos avançados complicados, temos sempre de ter cuidado... O Liedson e o Jardel eram perigosos, daqueles que podiam inventar um golo numa simples distracção. Tive o prazer de jogar com eles.

Prazer?

É sempre bom, é um privilégio jogar contra gente assim.

Mas num momento de pressão consegue ter calma para observar a beleza do jogo adversário?

Não é tanto assim, isso é mais complicado... Estamos concentrados de tal maneira que às vezes nem temos noção de tudo o que se passa. Às vezes só percebo que uma jogada aconteceu porque a vi depois na televisão.

Estava na baliza da selecção portuguesa na final do Europeu sub-18.

Sim, defendi dois penáltis contra a Alemanha.

Então lembra-se das grandes defesas?

Nem por isso. As defesas são todas importantes... Eu tento olhar muito para as coisas mais fáceis, às vezes no treino há quem não dê importância ao mais simples, como ensaiar um simples atraso e o pontapé, ou o remate fraco. Isso também faz muita falta, não se pode falhar aí.

Já parece um treinador de guarda-redes a falar.

[Risos] Gosto muito do trabalho dos guarda- -redes, quem sabe venha a fazer isso, mas nem sequer pensei no assunto. Tenho mais dois anos de contrato.

Um treinador de guarda-redes é muito importante? Luís Matos, ao que parece, saiu do Benfica culpado pela má época do Roberto.

Um treinador é importante, claro. Mas se estamos a falar do Luís Matos, convém lembrar que na época anterior ele também foi o treinador do guarda-redes menos batido do campeonato [o próprio Quim, no Benfica]. O Matos é um excelente treinador.

Como é que se recupera de um frango? No Benfica você ficou marcado com aquele lance contra o Vitória de Setúbal, mas custa-lhe mais isso ou ser goleado, como aconteceu no 6-2 contra o Brasil?

Os erros acontecem, depois há que assumi-los. No caso do Brasil foi diferente, porque toda a equipa esteve mal. Mas lá está, há bons e maus momentos e perante eles temos de seguir em frente. Não sou muito de recordar tudo, uma das situações que mais lembro são os últimos cinco ou dez minutos do jogo contra o Boavista, no Bessa, quando o Benfica se sagrou campeão em 2004/05. Estava a sagrar-me campeão no primeiro ano no Benfica!

Nessa época, depois de um jogo contra o Belenenses, em Dezembro, Trapattoni decide tirar o Moreira da baliza e lança-o a si. O que lhe disse a raposa?

Nada de especial, achou que devia mudar e mudou.

Nessas situações, como é que fica a relação com o colega de treino? Teve rivalidade com Moreira, Moretto... provavelmente voltará a vivê-la em Braga.

Podia falar mais ou menos com um ou com outro, mas nunca me dei mal com um colega. Cada um tem de treinar o melhor possível, porque quem ganha com isso é a equipa. É a concorrência e se a concorrência for boa...

No caso do Moretto, não me diga que achava que a concorrência estava à sua altura.

Podemos achar isso, mas no fim são opções do treinador. Não foi o caso de a concorrência ser fraca, foi a injustiça de me fazerem sair da equipa quando já estava a finalizar a recuperação de uma lesão e vinha há cinco jogos sem sofrer golos.

Com a chegada do Berni ao Sporting de Braga, a baliza está a um ou a dois passos?

Para já, o meu objectivo é sentir-me em perfeitas condições, o que felizmente consegui. Agora falta-me apenas ganhar ritmo, jogar. Sinto-me forte física e psicologicamente.

Qual é o prazo de validade de um guarda-redes?

Não sei, mas sei que nunca me senti tão bem como desde há um ano. Sabe aquela sensação de... de não se sentir pesado, de estar na melhor forma possível, no topo da experiência, confiante? Estou a atravessar essa fase e nem penso no final da carreira. Posso jogar mais três ou quatro anos.

Qual é o seu segredo?

Nada de especial, posso comer muito ou pouco mas nunca tive tendência para engordar. O peso mantém-se e isso ajuda muito um guarda-redes.

Quando Jorge Jesus o dispensou em directo na televisão ficou com mais força para mostrar que ainda pode jogar mais uns anos?

Não queria comentar isso, o Benfica é passado, vamos ao futuro... É claro que não me senti bem com o que se passou, essa opção podia ter sido tomada e comunicada duas ou três semanas antes; de resto, foi dispensado o guarda-redes titular e ficaram os suplentes... Mas se me deu mais força? Eu trabalho sempre da mesma forma, estou aí para trabalhar.

Quim, obrigado pela entrevista. Bom trabalho aí em Braga.

Obrigado.

Fonte:Ioline

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