Birgit Prinz: estrela do time alemão
A Alemanha tem tudo para abocanhar o terceiro título consecutivo da Copa do Mundo de futebol feminino. Hegemonia das alemãs é resultado de uma estrutura sólida de incentivo ao esporte existente no país.
Na Copa do Mundo das mulheres, a Alemanha é franca favorita. Não só porque joga em casa, conquistou os dois últimos títulos mundiais e venceu os cinco campeonatos europeus passados, numa hegemonia indiscutível. A temida equipe da treinadora Silvia Neid é, sobretudo, resultado de uma sólida estrutura de incentivo existente no país.
Enquanto as brasileiras apostam todas as cartas nos dribles de Marta e na técnica e talento natos das craques da seleção canarinho, as alemãs chegam ao torneio trazendo na bagagem um preparo iniciado ainda na infância e um calendário de jogos de fazer inveja.
Desde 1990, existe oficialmente um campeonato nacional de futebol feminino na Alemanha. Parece pouco tempo, mas pode ser considerado uma eternidade se for levado em conta que, no Brasil, somente em 2007 a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) voltou a organizar uma competição nacional entre mulheres de forma permanente.
Um milhão de alemãs contra 3 mil brasileiras
Campeãs em 2007 sem levar um gol sequer, alemãs têm tudo para ganhar em casa terceira Copa consecutiva
Os resultados desse incentivo não demoram a aparecer. A seleção feminina alemã sub-19 é a que tem o maior número de títulos na Europa, tendo arrematado seis vezes o campeonato europeu e uma vez o título mundial. Depois de a Fifa ter elevado a faixa etária da categoria para 20 anos, a equipe sub-20 conquistou também o último Mundial, no ano passado.
Se no Brasil o número de garotas futebolistas é avaliado em torno de 3 mil, na Alemanha, mais de um milhão de meninas e mulheres praticam o esporte regularmente. "Enquanto os homens são cada vez menos, o número de adeptas entre as mulheres continua aumentando. Espero que essa tendência continue por bastante tempo", comemora Theo Zwanziger, presidente da Federação Alemã de Futebol.
Craques desde pequeninas
A federação alemã investe nas crianças, através de iniciativas como o projeto "20 mil a mais – educadores para o futebol", que promove cursos de especialização para professores do ensino fundamental, tendo capacitado nos últimos dois anos mais de 14 mil profissionais.
Além disso, a entidade também vem reforçando o apoio à cooperação entre escolas e clubes de futebol. Somente nos colégios de Berlim, já existem cerca de 300 times de futebol feminino. Em relação às agremiações especializadas, só a capital alemã tem mais de 60 clubes que treinam quase 90 times de meninas.
Na Alemanha, o futebol é atualmente o esporte em equipe preferido entre as garotas. Elas podem praticar tanto em clubes tradicionais, como em agremiações especializadas em futebol feminino. Prova disso é que cerca de 30% das quase um milhão de jogadoras registradas no país têm menos que 16 anos. Há também escolas onde o futebol feminino é oferecido como atividade esportiva.
Steffi Jones: decepção com as condições no Brasil
Condições bastante diferentes foram a encontradas no Brasil pela presidente do comitê organizador da Copa na Alemanha, Steffi Jones. Em viagem ao país em março deste ano para promover a Copa do Mundo de 2011, a ex-jogadora da seleção feminina alemã não poupou críticas à falta de incentivo à modalidade entre os brasileiros. "Acho que a situação aqui ainda é bastante desoladora e ainda há muita coisa por fazer", opinou, depois de visitar o Vasco da Gama, no Rio, um dos clubes locais que investem em futebol feminino.
"Meninas e mulheres jogam aqui em todo lugar, na rua ou na praia. E são boas jogadoras. Só não consigo entender como as pessoas podem pensar tanto nos homens, sem dar a menor chance às mulheres", reclamou Jones, citada por uma rádio alemã.
Amadorismo ainda prevalece
Da mesma forma como no Brasil, muito poucas alemãs conseguem ganhar dinheiro com a bola. O profissionalismo no futebol feminino continua sendo uma exceção, mesmo na Alemanha, onde a grande maioria das jogadoras joga bola pelo amor ao esporte, mas ganhando dinheiro em empregos paralelos.
No país, o futebol feminino também ainda está muito longe de ser um fenômeno de massa e goza de uma popularidade limitada, se comparado ao correspondente masculino. Como no Brasil, poucos alemães conseguem citar espontaneamente o nome de uma jogadora da seleção do país. Quando muito, se recordam do nome da estrela principal do time: Birgit Prinz.
Um interesse tímido que pode ser medido nos estádios. Enquanto a média de público nos jogos da Primeira Divisão do Campeonato Alemão, a Bundesliga, é de 40 mil pessoas por partida, no caso das mulheres, esta cota é de cerca de mil espectadores por jogo.
"O futebol feminino tem filosofia, característica e dimensão próprias, tem outro tipo de torcedor", avalia Bernd Schröder, técnico do Turbine Potsdam, um dos clubes de maior sucesso na modalidade, duas vezes campeão europeu e cinco vezes campeão alemão. "O público é composto basicamente por familiares e pessoas que querem ver a estética mais leve da bola jogada pelas mulheres", acrescenta.
Colhendo frutos: apoio às garotas vem rendendo títulos
Categoria ficou proibida até 1970
A história de sucesso do futebol feminino alemão impressiona. Ainda mais quando se leva em conta que o início de sua história na Alemanha não foi exatamente um mar de rosas. Até pouco mais de 30 anos, o futebol feminino era proibido oficialmente no país.
Ainda que os primeiros times locais de mulheres tenham sido organizados nos anos 1930, a modalidade foi vetada em 1955 pela Federação Alemã de Futebol, e as atletas tinham que se organizar em clubes e entidades não reconhecidos.
Os dirigentes argumentavam que a disputa pela bola faria as mulheres "perderem a graça feminina'' e alegavam que o esporte poderia provocar danos físicos e psíquicos à mulher. O veto só foi suspenso em 1970. Mesmo assim, chuteiras com travas eram proibidas para as garotas, e a bola era mais leve e menor do que a dos homens.
Além disso, inicialmente a entidade determinou que o tempo de jogo para as mulheres era de 70 minutos. Talvez sirva de consolo às alemãs saber que no Brasil o futebol feminino só seria permitido pelo órgão esportivo competente mais de dez anos mais tarde.
Autor: Marcio Damasceno
Revisão: Roselaine Wandscheer
Sem comentários:
Enviar um comentário